Pesquisa do Palavrório

4.10.18

Triste país

Triste país. Vemos irmãos brigando com irmãos, amigos se separando de amigos, tudo por conta de um radicalismo que desde 2002 vem crescendo, em grande parte devido a um ex-presidente que apostou tudo no "nós contra eles" para se garantir no poder e que ainda hoje tenta influenciar o processo, apesar de estar preso. Não, não eximo de culpa os "eles", que se acovardaram e até repartiram o butim do roubo à nação que já existia desde 1500. O "nós contra eles" era retórica apenas, o objetivo de "nós" e "eles" sempre foi tirar do nosso bolso e por no deles.
O primeiro colocado nas pesquisas é um louco, um parlamentar sem representatividade e efetividade, mas que fala ao fígado das pessoas, principalmente na questão da segurança pública. O cidadão comum está com medo de ir às ruas, e não é medo de ser assaltado apenas, mas medo de ser morto se não entregar o celular da maneira correta. E esse medo é compartilhado pela "elite" que pode comprar o iPhoneX e pelo favelado que conseguiu a duras penas parcelar um MotoX nas Casas Bahia. É desse medo que o capitão cresce. As pessoas querem segurança e apoiam o discurso da brutalidade. O resto (economia, inclusive) é detalhe. Infelizmente, para o primeiro discurso funcionar, o resto, principalmente a economia, tem que ser bom. E ninguém sabe como será. O primeiro é uma péssima escolha.
Já o segundo colocado vem com o discurso da igualdade, do respeito, dos direitos humanos, e ele está certo. Um país civilizado se faz com respeito a todas as minorias, com o tratamento igualitário, com a garantia de acesso a um mínimo de dignidade de vida. Mas, ao mesmo tempo em que o candidato prega isso, os chefes do seu partido dizem que primeiro eles ganham a eleição, e depois tomam o poder. E apoiam ditadores como Maduro, Ortega e congêneres. E dizem que farão reformas, mas que em 13 anos nem sequer chegaram perto de propor algo. E, por fim, prometem retomar um programa econômico que jogou o país na pior crise de sua história. Dá para confiar? O segundo é uma péssima escolha também.
O terceiro seria uma anedota de mau gosto em um país civilizado. Toda a família sobrevive de cargos públicos. O próprio candidato não tem profissão. A tão falada revolução da educação em sua terra pode ter sido avaliada de maneira errada. Pode porque há relatos de fraude nos exames de qualidade. Por outro lado, há fatos concretos como o número de aprovados nos vestibulares mais difíceis do Brasil (ITA, IME etc.). Mas o candidato também se mostrou agressivo a pessoas que pensam contra ele, radical em vários momentos, misógino e sexista. E tem um outro maluco como inspirador de sua matriz econômica. A terceira escolha é péssima.
O quarto colocado é um tucano. Basta dizer isso: um partido que rouba, que não expulsa os que roubam e são condenados (vide Azeredo), que tem medo de se posicionar sobre qualquer assunto e que renegou a boa herança que FHC deixou (ele também deixou más heranças, e como o partido não se posicionou, também deve ser criticado por isso). A quarta escolha é péssima.
A quinta escolha é do gênero sabonete. A mulher, até hoje, não se posicionou sobre Lula. Ou ela é a favor da Justiça ou a favor do ladrão. Também não tem coragem de falar. A quinta escolha é péssima.
As outras opções são risíveis. Talvez o Meirelles e o Amoedo pudessem ser considerados, mas a falta de empatia de um e a falta de tempo e ar elitista do outro os impedem de crescer. O cabo é louco. O bolo é criminoso. A Vera não sabe o que diz ("Estatizaremos as 100 maiores empresas do Brasil"). O Coringa do Jack Nicholson tem um passado ruim no Paraná. O Goulart ninguém sabe como conseguiu ser candidato. E o democrata cristão conseguiu algum sucesso com o meme em que seu jingle aparece mixado em uma rave de praia, e não mais que isso. Enfim, aguardemos e oremos.
Tudo isso é para dizer que, em minha opinião, nós brasileiros estamos brigando pelos motivos errados. Quem vem à Internet dizer que "sinto-me leve por ter tirado todos os apoiadores do Bozo da minha lista de amigos" errou na ação. Em vez de entender porquê essas pessoas votam no Bozo, preferem se voltar para a questão elitista do "não aceito quem apoia fascistas". Do outro lado, quem retira os petistas de suas listas não quer ver que, eventualmente, a pessoa pode ter um familiar que chegou à universidade pelo ProUni, ou que conseguiu alguma comida com o Bolsa Família (critiquem-se os programas e sua execução, mas não seus objetivos). Estamos na fase do "quem não concorda comigo é meu inimigo", e deixamos de dialogar. Descontando os ignorantes das torcidas organizadas (só os ignorantes, ok?, pois há alguns que não o são), no bar os adversários sentam-se à mesa para falar sobre futebol, discordar e não brigar. Você sabe que nunca convencerá o flamenguista a torcer pelo Vasco, e daí? Vale a conversa, vale a troca de ideias, vale o momento de bom deboche um com o outro. Não, não temos mais isso, agora é ou comigo ou contra mim.
O brasileiro está cego de raiva e ódio. O brasileiro está pronto para brigar por qualquer olhar enviesado no bar, na rua, na seção eleitoral. O brasileiro não é mais cordial. O brasileiro está cansado e exausto, e nessa situação ninguém toma uma decisão sensata. Espero apenas que sobrevivamos a 2018.

28.5.18

Mais uma derrota

Perdeu. Perdi. Perdemos. Já não sei qual é o meme correto, mas é essa a sensação. Perdeu o Brasil. Perdi a oportunidade. Perdemos todos. Somos mais uma geração perdida, de mais uma década perdida, de mais uma quantidade enorme de esforço para tentar melhorar e não conseguir e voltarmos às soluções mais populistas e rastaqueras que podem existir.
Onde foi que erramos? Acordei de manhã tentando ver em qual ponto do caminho, desde 1970, eu pude fazer algo diferente e não fiz. Sim, essa é a praga (ou benção) de quem faz análise, assumir a culpa pelos próprios erros, não ficar responsabilizando o sistema ou os outros pelas desgraças que lhe acometem. Onde foi que erramos? Onde foi que errei?
Obviamente, não há uma resposta única. Pois quando eu começo a tomar consciência, estávamos terminando a ditadura. A inflação começava a galopar, resultado da utopia do Brasil gigante promovida pelos militares. Figueiredo sai de cena de maneira melancólica ("Me esqueçam!") e entra o Sarney, um oportunista que sempre esteve ao lado dos militares e aos 44 do segundo tempo troca de time. Sem a menor condição de governar (sinto-me inclinado a dizer sem capacidade, pois é o que a história mostra), ele comete um erro econômico atrás do outro. Ontem, diante de algumas prateleiras vazias no supermercado, lembrei da comédia sem graça dos fiscais do Sarney. Inocentes úteis que esbravejavam contra os empresários do setor de alimentação. Ora, como culpar alguém que não quer trabalhar para não levar prejuízo? O último ano do Sarney, para quem lembra, foi melancólico. Contávamos os dias para as eleições, para ver se algo mudaria, pois ninguém acreditava no País.
Aí cometemos o Collor. Cometemos no plural, toda eleição é um processo coletivo, e não podemos lavar as mãos depois como fizeram alguns idiotas ao dizer "a culpa não é minha, votei no Aécio". E o Collor veio com o confisco, um roubo escancarado à luz do dia. Algumas pessoas se mataram. Quem pode saiu do país. Alguns enriqueceram muito pois foram avisados do que viria. E mesmo assim sobrevivemos. Não sei bem como, mas o Brasil conseguiu sair melhor do Plano Collor. E acreditamos que se o Collor deixasse a presidência, as coisas melhorariam. De fato, melhoraram um pouco. Mas nós achamos que bastava ir à rua, não quisemos meter a mão na massa, ou seja, entrar no processo político para tentar mudar as coisas por dentro, mudar o sistema político.
E veio o Plano Real e o FHC. O Plano Real sozinho é o maior responsável por reduzir a desigualdade social. Mas o FHC preferiu ficar no populismo, de novo, em vez de atacar os problemas reais do Brasil. Teve a chance que queria de fazer uma reforma da previdência, mas não conseguiu (e não adianta meter a culpa no Kandir, que diz que votou errado no Congresso). Não propôs reforma tributária, nem fiscal nem nada. Achou que bastava uma moeda estável. Ajudou a lotear estatais, sucateou escolas e universidades (logo ele, um professor) e, algo que talvez não tenha sido analisado pelos historiadores, contribuiu para que as direções dos partidos políticos tomassem decisões sem consultar suas bases. Quem ainda pensava em entrar na política desistia, pois tinha a certeza de que não seria ouvido se não fosse apadrinhado por alguém importante.
Por essas e outras que o Lula sucedeu o FHC, e não o Serra. Noves fora a falta de carisma, todos estavam cansados do velho. Mas o Lula revelou-se tão velho quanto Matusalém. E com uma conjuntura internacional altamente favorável, conseguiu não fazer nada para reformar o Brasil. Toda a sua política assistencialista, um bom pedaço dela necessária, estava financiada pelos superávits de ocasião. Ele poderia ter aproveitado a bonança para fazer uma reforma fiscal, uma tributária, uma da previdência, enfim, ele poderia fazer o que quisesse, tinha 80% dos votos no Congresso, aprovação de mais de 70% da população. E o que fez? Distribuiu benesses para os amigos da corte, demonizou as elites, e ficou nessa de inflamar uma torcida contra a outra. Ou seja, não governou, fez barulho apenas. E quem era moderado não quis entrar no debate político para não ser hostilizado. Ficamos de fora de novo, perdemos a chance de tentar influenciar a política para que ela trabalhasse pela sociedade.
A Dilma e a catástrofe econômica dela são resultado direto da megalomania econômica do Lula. Uma senhora que não conseguiu administrar uma loja de R$ 1,99 iria conseguir administrar um país? Obviamente que não. As pessoas eram as mesmas, e os ventos internacionais já não eram mais favoráveis. E quando os ventos são revoltos, só os bons marinheiros seguem adiante. Não era o caso. Mas ela continuava insuflando o Fla-Flu político. Os moderados não tinham voz. Os sensatos não tinham voz. E dá-lhe criar estatais para dar mais cargos a inúteis. Hemobras, Petrosal, uma para cuidar de estradas (não basta o DNIT), Valec, vamos que vamos, é o grande estado para conduzir o povo rumo à glória. Que bosta. O que nós fizemos? Fomos reclamar da passagem de ônibus. Mas fomos reclamar como sempre fizemos: que o governo subsidie algo, não que a gente trabalhe para um país mais justo. É sempre assim, queremos a Mãe Estado nos suprindo, sem trabalhar.
O Temer é uma piada de mau gosto. Independente de como assumiu o poder, o governo dele terminou quando ficou escancarado que ele era conivente com o Eduardo Cunha (a desconfiança era grande, as gravações do Joesley só deram certeza). E que o Eduardo Cunha, Temer e toda a curriola da cúpula do PMDB estava nos roubando desde o primeiro governo Lula, e que viram no impeachment uma oportunidade de roubar sozinhos, sem a participação do PT. Muitos apoiaram a queda da Dilma, pois muito provavelmente com ela estaríamos hoje a um passo da Venezuela. Mas teremos que aguentar o Sarney dois, mais sete meses sem governo, até 1º de janeiro de 2019.
Perdeu. Perdi. Perdemos. Cada nova notícia deixa a gente mais para baixo. Como manter a esperança e transmitir algum otimismo para os filhos? Como chegar no trabalho e dizer aos funcionários que os salários serão pagos em dia, se não conseguimos vender nada na semana que passou pois não tínhamos como entregar? Como argumentar com os sócios que os onipotentes fiscais da atividade ora julgam de uma maneira, ora de outra? Será que ainda dá tempo de mudar alguma coisa? Ou será melhor mudar-se, deixar o país nas mãos dos bandidos e eles que se matem aos poucos? Não sei. Perdi. Perdeu. Perdemos.