Pesquisa do Palavrório

10.9.09

Páginas em branco

Espalhados pela mesa estão muitos papéis, com muitas informações. Por enquanto, desconexas entre si, são apenas números, palavras, dados, impressões e opiniões sobre o que há e o que está por vir. Nada concreto, nada certo.
O que é difícil encarar é essa tela em branco, essas páginas em branco que devem ser preenchidas com boas palavras, boas frases, bons textos. Difícil também é gerenciar a expectativa, ficar dependendo do outro para que ele passe a cola que ligará todas as informações e a transformará em um texto útil, que sirva para alguém.
Parece que viver é esperar algo, ainda que você tenha cutucado para que a resposta venha antes e não caia no seu colo. Não, ela não cairá, mas uma vez engrenada a marcha, o resto é aguardar.

4.9.09

Velhos amigos


Para meus amigos Medianeirenses

A minha turma da escola voltou a se reunir. Pouco mais de 20 anos depois de termos deixado o Colégio Nossa Senhora Medianeira, um dos mais tradicionais de Curitiba, a turma voltou a se encontrar. Não sei bem como começou a troca de mails, mas sei que ela vem crescendo a cada dia, com novos velhos integrantes sendo reincorporados ao novo velho grupo.
O mais bacana de tudo é ver que apesar dos cabelos grisalhos (quando há cabelos), das barrigas, das mulheres e ex-mulheres, dos filhos, somos ainda os mesmos piás de bosta de 22 anos atrás. Bastam dois se reunirem para começar a voltar as histórias do passado, os vexames, as tentativas fracassadas de agarrar alguém, as tentativas de sucesso de agarrar quem não devia ser agarrado, os apelidos, as situações, volta tudo em uma torrente que fica difícil segurar o riso.
Nem só de passado vive o homem, mas esse passado toca fundo em nós. Foi a melhor época de nossas vidas (ainda que eu não tenha comido ninguém, não por falta de tentativa, mas por absoluta falta de savoir-faire. Não conseguia imaginar a frase que fazia com que uma mulher menina daquela época passasse dos beijos para a a cama comigo. Acho que ainda não sei, mas dei um jeito depois), uma época em que podíamos tudo, em que todo o futuro estava à nossa frente e tínhamos total confiança de que conseguiríamos o que quiséssemos. Éramos os tais.
E como é bacana ver que as relações estabelecidas naquela época continuam fortes, continuam firmes. Claro, não houve contato frequente na maioria das vezes entre as pessoas. No entanto, parece que demos tchau ontem, no último dia de aula do terceiro ano do segundo grau, e que hoje é o primeiro dia de aula depois das férias. Alguns se viram durante elas, a maioria não, mas todos, todos, se conhecem, se falam, se relacionam e tem pontos em comum. Não há estranhos no meio, apenas amigos e colegas. Não é uma sensação de dejá vu, mas uma sensação de retorno a um lugar conhecido em que estávamos muito bem. Sentimo-nos todos confortáveis e seguros, pois estamos em casa, entre os nossos. É essa sensação que faz com o que passado seja muito forte entre nós. Éramos um grupo, somos um grupo, seremos um grupo unido por crenças maiores, únicas, que somente a nós pertence (tenho certeza que há muitos grupos semelhantes por aí, mas esse é o nosso). E levaremos isso para todo o sempre.
Hoje, aos 40, estamos revivendo nossos passados com a troca de relatos e a relembrança de fatos que talvez fosse melhor que tivéssemos esquecido. No entanto, são fatos que definem quem somos. O tempo separou quase todos e poucos mantiveram um relacionamento constante. Entre alguns que se reencontraram, há as sementes para se recomeçar um relacionamento, uma relação que viva também do futuro, não apenas do passado. Na maior parte, porém, será uma grande farra reencontrar-se com alguma frequência para falar besteiras.
E só por isso, já valerá a pena.
Grande turma!

2.9.09

Sem glamour

Acordar. Passar café, tirar as crianças da cama, comer com eles, pegar o carro, levá-los à escola. Parar na mercearia para comprar frutas, errar na escolha de umas (ainda não ter aprendido a comprar banana, que dureza...), acertar outras, voltar pra casa.

Instalar o fogão novo, checar o mail, arrumar a caixa de ferramentas, deixar tudo preparado para o próximo estrago de alguma coisa que inevitavelmente acontecerá, mas não se sabe o quê. Aguardar.

Buscar as crianças na escola, perguntar como foi o dia, almoçar com eles, dar uma pausa e começar a cobrar as tarefas: lição de casa tá pronta?; tá arrumada pra aula de piano e balé?; pôs o kimono para o tae kwon do?; tem que comprar pão?; falta cotonete, passe na farmácia e compre.

Voltar, mandar as crianças tomar banho, tomar banho também, por uma roupa confortável, preparar o jantar, esperar a mulher voltar do trabalho, jantar com todos, mandar todos para a cama, ir para a cama, ler um pouco, quem sabe, e dormir.

Sem frescura, sem glamour. Mais um dia como todos os outros, mais um dia para esperar algo que, sem saber o que é, se espera que apareça do nada. Nem procurar se vai, por isso não há o que reclamar. Um dia comum, igual a milhares de outros dias de outras pessoas espalhadas pelo mundo, que também esperam algo que não sabem o que é, que lhes dê mais tempero na vida. Quando o que dá gosto é justamente o cotidiano, o saber vivê-lo sem esperar glamour, sem esperar o brilho falso. Lição difícil, mas necessária.