Pesquisa do Palavrório

21.10.08

Velhos amigos

Quatro senhores estão sentados à mesa de um restaurante vegetariano. Normalmente, restaurantes vegetarianos já são lugares mais calmos que outros restaurantes. Deve ser o perfil de quem opta por uma refeição sem carne: gente que procura uma comida mais saudável, gente que já abandonou a carne vermelha, pessoas mais pacatas, enfim. (No meu caso, vou a vegetarianos pelo silêncio e pela fartura, mas não abandono um bom churrasco).

São quatro senhores que falam muito mais pelas pausas que pelas palavras. Eles soltam frases curtas, sobre assuntos desconexos, de tempos em tempos. Não há uma torrente de palavras entre eles. Um relembra um local onde se dança, diz que levará o outro, que dá risada, pois aquele problema na perna que o incomoda há anos o impede de dançar. Todos na mesa sabem disso, mas o convite é feito mesmo assim. Algumas frases tem que ser ditas um pouco mais alto, pois a audição já não é mais a mesma. Não há nenhuma troca de idéias, apenas troca de impressões entre eles.

Ninguém fala de suas famílias, nem uma palavra sobre os filhos. O quão diferente eles são de mulheres, que vivem a falar de suas famílias e seus filhos, não importa com quantos anos estejam. Mas todos os senhores sabem tudo sobre a família dos outros, apenas que, por alguma razão, não comentam isso com os outros. Não perguntam, não são perguntados. E as bocas se calam com pedaços de comida, para não ter que falar nada que não se queira.

A refeição acaba, e os quatro se levantam. É uma marcha lenta rumo à porta de saída do restaurante. Um manca, o outro tem uma bengala, o outro caminha aquele passo vacilante de quem já passou da idade de correr, mas vão, firmes e oscilantes, rumo ao resto do dia e de suas vidas, que lhes aguardam logo ali, virando a esquina.

18.10.08

GPS, ou G-Point Search

Meninos, eu descobri!! Nós, homens, temos dentro de nós a ambição de virmos com um GPS embutido. Claro, não falo de um Global Positioning System, esse equipamento que virou moda nos carros do mundo, e que sim pode ser muito útil em países onde não se fala a língua local ou nos Estados Unidos, com aquelas puta auto-estradas com zilhões de entroncamentos, viadutos e passagens. Falo de algo mais simples, mas muito, muito, muito mais prazeiroso, que é o G-Point Search.
Ora, um dos grandes mitos do sexo é encontrar o ponto G das mulheres. E dá-lhe manual, dá-lhe aulas com sexólogos e sexólogas, dá-lhe busca na Internet (curiosidade: o Google registra 40,5 milhões de páginas para G Point e 422 mil páginas para Ponto G, uma prova de que nós brasileiros somos menos encanados com essa busca que os americanos) para ver se achamos esse bendito (ou maldito) ponto que fará as mulheres gozarem loucamente, caírem a seus pés, satisfazerem todos os seus desejos, inclusive os mais sórdidos, porque você sabe onde é o Ponto G dela.
Logo, se viéssemos com um G Point Search que nos dissesse exatamente onde está o ponto na mulher, iríamos direto a ele, tal e qual o GPS popular. Era pegar a moça, deitá-la, acionar o GPS masculino e pimba, gol de placa, arremesso certeiro, tacada infalível. E além de tudo estaríamos posando de grandes amantes. É nunca errar mais o caminho para chegar lá, com todas as metáforas possíveis.
Porém, e há um grande porém nisso, acabaria a graça da coisa. Mesmo em países em que você não fala direito a língua do local, pode haver uma grande graça e diversão em buscar o seu destino final, sem o auxílio de um GPS (claro, estou falando de países em que as chances de você ser depenado por ladrões sejam mínimas, países civilizados). Muitos filósofos já disseram que a busca é tão importante quando chegar lá. No meio do caminho, perdidos, podemos encontrar um vilarejo interessante, uma festa que não aparece nos guias de turismo de tão local que é, um restaurante perdido no meio da montanha com um pernil em trufas sensacional, enfim, tudo pode acontecer, e se estivermos de cabeça aberta, as chances são de que aconteçam mais coisas boas que ruins.
Com a mulher e o sexo, é assim também. O fato de elas insistirem tanto nas preliminares não é que elas não querem te dar. Mas é que elas amam ser exploradas (no bom sentido), ser descobertas. Elas querem que a gente passeie por elas, que encontre outros tantos pontos que não apenas o G, mas também o A, o B, o C, o alfabeto inteiro. Elas querem calma, não afobação. Mais que uma corrida de 100 m, elas querem sempre meia maratona, no mínimio. O prazer de chegar ao Ponto G só é bom se você demorou para encontrá-lo e se divertiu no meio do caminho. Aí, mesmo que você não o encontre, a viagem terá valido a pena.
De todo modo, deixe-o pronto para ser utilizado. Vai que a estrada está esburacada naquele dia, e é necessário chegar rápido lá. Nunca se sabe...

16.10.08

Resiliência humana

Há pelo menos 20 anos ele está nas ruas de Curitiba. É um mendigo, de pele negra, sem a perna direita, e que cambaleia pelas ruas com apenas uma muleta. Sua "morada" é próxima à Praça Rui Barbosa, uma das principais da cidade. Não poucas vezes eu o vi dormindo no meio da calçada, de qualquer calçada, com movimento ou sem. Nunca vi ele nem abrir a boca para pedir esmolas, mas, de alguma maneira que me intriga, ele sobrevive.

 

Eu sei que ele tem uma missão nesse mundo, e a missão dele é nos ensinar alguma coisa. Somos nós, que temos conforto material e boas condições de vida, que temos que nos mexer para mudar o mundo. No entanto, eu me pergunto sempre o que leva pessoas como ele a insistir sempre em sua missão. Não seria mais fácil desistir de tudo, largar dessa vida e esperar a próxima encarnação para ver o que acontece?

 

Parece mais fácil, mas ele e outros milhares de mendigos espalhados pelo mundo não fazem isso. Continuam vivendo pelas ruas, sem abrigo, sem conforto, esperando as migalhas da bondade humana que eventualmente lhes são jogadas. Continuam ali para tentar nos ensinar alguma coisa, algo que nós, teimosamente e por conforto, insistimos em não aprender.

15.10.08

Psicologia corporativa

Trabalhar em uma empresa grande pode dar vários insights sobre a psicologia humana. É que, mesmo em um "organismo" com milhares de pessoas, vemos a repetição de alguns comportamentos que indivíduos possuem.

 

Por exemplo, a mania que temos todos de tentar colocar a culpa nos outros. Em uma empresa, é praticamente impossível que alguém diga que a culpa é sua ou de seu departamento. Na maior parte dos casos, o problema está ou no Jurídico, que não entregou o contrato revisado, ou no Compras, que demorou para liberar o pedido de compra de material, ou no Marketing, que fez um produto errado e uma propaganda feia, mas nunca no departamento correto, Vendas por exemplo, que não consegue vender nada.

 

As empresas também sofrem um pouco de instabilidade emocional. Pessoas, quando submetidas a situações de estresse, tentam várias alternativas para se livrar disso, algumas saudáveis outras não. Na crise dos dias de hoje, por exemplo, as empresas estão todas batendo a cabeça internamente para rever planos de negócios, rever orçamentos, metas de crescimento, tudo. Ninguém sabe se a crise durará ou não, e antes mesmo de qualquer coisa ser definida, todos estão em pânico, sem saber o que fazer.

 

Claro que vários pensadores já viram nas organizações organismos vivos, com comportamentos semelhantes a seres humanos. Só que ninguém disse como esses monstros vão ao divã para se curarem. Onde está o Freud dessa turma? Qual será o trauma de infância das organizações? Complexo de Édipo, de Electra? E a inveja do pênis (já que são as organizações, não "os" organizações), qual é o pênis invejado pelas empresas? Dúvidas, dúvidas...